23 junho 2006

Sentido

Na sessão do "directo-em-questão" falou-se sobretudo do método de filmagem, ou de como diferentes situações conduzem a diferentes estratégias. Como depois disse Rahul Roy, mais importante que uma “obsessão pela pureza”, em que ele não acredita, é ser o documentário uma forma artística baseada em objectos encontrados (“found objects”) e numa estratégia para ir ao seu encontro.

E embora a rodagem seja uma fase crucial na construção do olhar, só na montagem se define o sentido do filme. Geralmente, o realizador baseia as suas decisões em certas intuições fortes e iniciais. Mas à medida que se vai familiarizando com o material n vezes repetido, perde a distância e o juízo crítico. Só lhe resta confiar nas suas visões iniciais (com isto pressupondo o carácter visionário do trabalho do cineasta).

É por isso – por haver distância - que é sempre mais fácil criticar o trabalho dos outros que o nosso. Mas não somos todos como Wiseman, que nunca muda nada num filme por ouvir opiniões alheias, como ele o disse, e que prefere confiar no seu próprio juízo, pois não há nenhuma cena que não esteja racionalmente justificada no filme. E é por isso que não se incomoda nada de obrigar o espectador a ver um filme com mais de 4 horas sem fazer intervalo (o que é uma prova atlética difícil, mas vale sempre a pena).

A lição de Wiseman, em Serpa, (a que não assisti no sábado) desenvolveu-se, segundo me contaram, a partir de excertos de obras suas, sobre os quais o realizador dirigia perguntas à assistência, promovendo uma reflexão a nível da interpretação dos segmentos. (Bem gostava que algum bloguista se lembrasse de reunir as suas notas deste close reading...)

A discussão sobre o sentido dum filme – que não sobre o real que preside ao filme – torna-se cinematográfica pertinente quando se analisa e interpreta – a partir das opções do filme - o sentido de cada sequência e da sequência das sequências. Quando, além do texto (as imagens), se lê o subtexto (as intenções) – forma de pensamento muito americana e por isso muito clara. A nossa (?) maneira de pensar é muito mais metafórica, palavrosa, indirecta...

(Notas sobre o Doc's Kingdom em Serpa.)

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